domingo, 25 de setembro de 2016

A preguiça é virtude...



Aproveitando uma crónica de opinião no DN de António Barreto, com alguns excertos transcritos a seguir, não podia deixar de salientar o paralelismo, que senti durante a leitura do texto, com o que se passa na Educação.


Preguiça, lugar-comum, boçalidade, vulgaridade, falta de cultura e banalidade. O que se aplica às redações de jornais e televisões, segundo António Barreto, também se aplica aos anfiteatros das faculdades deste país.


Superficialidade, generalidades, trivialidade, facilitismo, ostentação, ausência de espírito de crítica e sacrifício. Tudo isto aliado a um cansaço quase permanente que os estudantes revelam, causador de lapsos de concentração frequentes. Esta é a realidade quotidiana das salas de aulas de Escolas e Faculdades em Portugal. Este é o cenário com que se deparam professores deste país, todos os dias.

Já começam a sair resultados de estudos que comprovam os malefícios e riscos da internet que correm os jovens adolescentes e adultos: gaming, gambling e outros vícios.

Por isso, caro António Barreto, a realidade das redações de jornais e televisões não é mais do que consequência do quotidiano do Ensino. Esses estagiários de jornalismo mais não fazem do que aplicar no seu trabalho os métodos e práticas com que sempre viveram.


TRANSCRIÇÃO DA CRÓNICA DE ANTÓNIO BARRETO, PUBLICADA NO DN (25.09.2016):


É simplesmente desmoralizante. Ver e ouvir os serviços de notícias das três ou quatro estações de televisão é pena capital. A banalidade reina. O lugar-comum impera. A linguagem é automática. A preguiça é virtude. O tosco é arte. A brutalidade passa por emoção. A vulgaridade é sinal de verdade. A boçalidade é prova do que é genuíno. A submissão ao poder e aos partidos é democracia. A falta de cultura e de inteligência é isenção profissional.


Os serviços de notícias de uma hora ou hora e meia, às vezes duas, quase únicos no mundo, são assim porque não se pode gastar dinheiro, não se quer ou não sabe trabalhar na redacção, porque não há quem estude nem quem pense. Os alinhamentos são idênticos de canal para canal. Quem marca a agenda dos noticiários são os partidos, os ministros e os treinadores de futebol. Quem estabelece os horários são as conferências de imprensa, as inaugurações, as visitas de ministros e os jogadores de futebol.


Os directos excitantes, sem matéria de excitação, são a jóia de qualquer serviço. Por tudo e nada, sai um directo. Figurão no aeroporto, comboio atrasado, treinador de futebol maldisposto, incêndio numa floresta, assassinato de criança e acidente com camião: sai um directo, com jornalista aprendiz a falar como se estivesse no meio da guerra civil, a fim de dar emoção e fazer humano.


Jornalistas em directo gaguejam palavreado sobre qualquer assunto: importante e humano é o directo, não editado, não pensado, não trabalhado, inculto, mal dito, mal soletrado, mal organizado, inútil, vago e vazio, mas sempre dito de um só fôlego para dar emoção! Repetem-se quilómetros de filme e horas de conversa tosca sobre incêndios de florestas e futebol. É o reino da preguiça e da estupidez.


É absoluto o desprezo por tudo quanto é estrangeiro, a não ser que haja muitos mortos e algum terrorismo pelo caminho. As questões políticas internacionais quase não existem ou são despejadas no fim. Outras, incluindo científicas e artísticas, são esquecidas. Quase não há comentadores isentos, ou especialistas competentes, mas há partidários fixos e políticos no activo, autarcas, deputados, o que for, incluindo políticos na reserva, políticos na espera e candidatos a qualquer coisa! Cultura? Será o ministro da dita. Ciência? Vai ser o secretário de Estado respectivo. Arte? Um director-geral chega.


Repetem-se as cenas pungentes, com lágrima de mãe, choro de criança, esgares de pai e tremores de voz de toda a gente. Não há respeito pela privacidade. Não há decoro nem pudor. Tudo em nome da informação em directo. Tudo supostamente por uma informação humanizada, quando o que se faz é puramente selvagem e predador. Assassinatos de familiares, raptos de crianças e mulheres, infanticídios, uxoricídios e outros homicídios ocupam horas de serviços.


A falta de critério profissional, inteligente e culto é proverbial. Qualquer tema importante, assunto de relevo ou notícia interessante pode ser interrompido por um treinador que fala, um jogador que chega, um futebolista que rosna ou um adepto que divaga.


Procuram-se presidentes e ministros nos corredores dos palácios, à entrada de tascas, à saída de reuniões e à porta de inaugurações. Dá-se a palavra passivamente a tudo quanto parece ter poder, ministro de preferência, responsável partidário a seguir. Os partidos fazem as notícias, quase as lêem e comentam-nas. Um pequeno partido de menos de 10% comanda canais e serviços de notícias.


A concepção do pluralismo é de uma total indigência: se uma notícia for comentada por cinco ou seis representantes dos partidos, há pluralismo! O mesmo pode repetir-se três ou quatro vezes no mesmo serviço de notícias! É o pluralismo dos papagaios no seu melhor!

domingo, 28 de agosto de 2016

Em defesa da ruralidade



A discussão "Campo ou cidade?" voltou à atualidade, num tempo em que a era digital e a internet colocam próximas pessoas que se encontram geograficamente afastadas. Na realidade, o aparecimento de profissões digitais tornou possível trabalhar a partir de casa, seja numa pequena fração de uma torre de uma grande metrópole ou numa pequena cabana rodeada de vegetação luxuriante, no mais isolado dos locais.

Tenho constatado nos últimos tempos que as grandes cidades estão "doentes". A procura de um habitat saudável passa, a meu ver, por um misto de urbanidade/ruralidade. O bem estar psicológico é possível se obtivermos das cidades o melhor que elas oferecem e da natureza a tranquilidade de que necessitamos. Como faço questão de fundamentar a defesa da ruralidade, pesquisei.


Stanley Milgram, psicólogo da Universidade de Yale, foi um dos primeiros a compreender as diferenças. A sua tese defendia que a maior diferença entre os dois âmbitos é o nível de estimulação. Assim, segundo Milgram, a cidade bombardeia-nos com uma torrente de mensagens sensitivas que ultrapassa a capacidade humana de processar informação. Ou seja, há demasiadas coisas e não podemos dar atenção a tudo. Por isso, colocamos em funcionamento um mecanismo de adaptação: ignorar tudo o que não seja relevante.

Na mesma linha vão os estudos de Stephen Kaplan, da Universidade do Michigan. A sua principal tese pode ser resumida numa frase: “O cérebro também se cansa.” As investigações conduzidas por Kaplan demonstram, por exemplo, o modo como a nossa memória ou a execução de tarefas melhoram depois de um passeio por um lugar tranquilo.

A hipótese em que trabalha é que os ambientes que causam mais stress (ruas com engarrafamentos, aglomerações...) obrigam a efetuar um esforço mental, ativado por estímulos fundamentais para a sobrevivência. Esse fluxo contínuo dificulta a atenção direta, isto é, aquela que podemos focar voluntariamente. Daí que o nosso cérebro repouse mesmo que seja apenas ao contemplar a fotografia de uma paisagem; e também, explica o psicólogo norte-americano, quando nos sentamos num parque ou caminhamos por uma rua só para peões. 


De qualquer modo, a influência negativa das paisagens construídas pelo homem no nosso estado de espírito é um facto constatável, como confirmou, em 1984, Roger Ulrich, da Universidade do Texas. O professor analisou a recuperação de um grupo de doentes submetidos à mesma intervenção cirúrgica: alguns podiam ver, pela janela do hospital, as árvores de um jardim, enquanto os restantes contemplavam uma parede de azulejos. Os relatórios médicos concluíram que os primeiros recuperavam muito antes, devido ao melhor estado anímico e ao seu otimismo.

Muitos outros estudos atribuíram o agravamento do nosso estado de saúde à influência das metrópoles modernas. Um dos mais recentes, conduzido em 2010 por Brendan Kelly, da Universidade de Dublin, estabelecia que o risco de sofrer de esquizofrenia aumenta quando alguém nasce ou vive longas temporadas em áreas urbanas, sobretudo se for do sexo masculino.

Atualmente, os especialistas procuram descobrir as causas para a inegável influência tóxica do betão. Alguns trazem à baila circunstâncias que seria importante minimizar, como a fragmentação social, o stress provocado pelo excesso de estímulos ou problemas de desenvolvimento neuronal.